TWITTER | A sua Central de Reclamações

|E ASSIM CHEGAMOS AO TWITTER…|

No princípio era o verbo e o verbo estava com Deus e o verbo era Deus, que já devia estar cansado de nada e resolveu criar o Universo e, de quebra, a Terra. Mas aí a Terra ficou sem forma e vazia, então Deus botou tudo nos seus devidos lugares e criou a luz e as aves e os dias e, lá pelo versículo 26, criou o homem. Foi nessa ocasião que Deus elevou a moral e os bons costumes humanos, fazendo o ser primitivo conforme a Sua imagem e de acordo com a Sua semelhança; concedendo-lhe, inclusive, as capacidades verborrágicas.

Só que o homem, que nunca perde muito tempo para nada, deve ter aproveitado o momento para dar uma reclamadinha básica por não ter muito com quem reclamar. Então Deus, no auge da Sua generosidade, criou a mulher. A mulher deve ter reclamado de tédio e foi ter com a serpente. A serpente, doida para implantar uma discórdia no Jardim, apresentou-lhe a árvore do conhecimento: com aquela ali, disse, o ser feminino conheceria a diferença entre o bem e o mal e passaria a reclamar registradamente. E com razão.

Imagino que depois disso o Criador chamou o homem primitivo na xinxa e mostrou as grandes responsabilidades que sempre acompanham os grandes poderes. O homem ainda tentou argumentar: “tudo culpa dessa mulher que o Senhor me deu, tudo culpa dela!” Aí Deus, coitado, impacientou-se de vez e preferiu se afastar um pouco de seres tão, tão insatisfeitos. Deixou o homem falando sozinho. O abandonado, cansado de lançar palavras ao vento, recorreu aos sinais materiais para desabafar de forma permanente. Assim, ele criou a Escrita, este processo da linguagem que dividiu a civilização em antes e depois dela.

“A história da escrita se identifica com a história dos avanços do espírito humano”, soltou Charles Higounet no livro “História Concisa da Escrita”. Acho que os autores bíblicos discordam um pouco disso. Para eles, usar da árvore do conhecimento e ainda perpassar o tal fruto para as gerações seguintes estava mais para regressão do que para avanço. De minha parte, com apenas 37 anos de idade, sinto-me incapaz de opinar em arenga tão antiga.

Caso é que para registrar suas reclamações, os seres primitivos precisavam de ferramentas específicas, como instrumentos pontiagudos e matérias duras, a exemplo da pedra, do tijolo e do osso. Depois, o negócio evoluiu para tinta especial e papiro. Milhares de anos depois, chegou o Twitter.

Se você viveu as últimas duas décadas em Urano e só hoje baixou na Terra, provavelmente não saberá que o Twitter é uma rede social – a sexta mais utilizada no Brasil em 2018, de acordo com o TechTudo – considerada um microblogging, por ter limite de publicação de 280 caracteres. Nesta rede podemos fazer de um tudo. Ela parece ser assim um misto de Portal da Transparência (com muitas ressalvas), Reclame Aqui e Consultório Psicanalítico – isso sem levar em conta o negócio das propagandas políticas, do marketing empresarial e do monitoramento da vida alheia.

Todo mundo usa, inclusive eu. Todo mundo reclama, inclusive eu. Todo mundo dá as suas abusadinhas, inclusive… Não, eu não. O engraçado é que, mesmo tendo entrado no Twitter em 2011, só me dei conta do valor da rede ano passado, quando descobri que todas as tretas do mundo começavam exatamente nela.  Como adoro acompanhar uma boa contenda – e deve ser por isso que fiz Jornalismo, visto que jornalista além de fofoqueiro social é um ótimo treteiro –, voltei definitivamente em 2019. Foi aí que o bicho me picou. Comecei a reclamar de todo mundo: reclamei do governo; reclamei da oposição; reclamei do mercado editorial, que está em crise; reclamei dos reclamões e agora estou reclamando das minhas próprias reclamações. O vício é viral. Saiu de Adão, atravessou milhares de milhares de milhares de anos e assola com tudo hoje em dia.

Como sei que você provavelmente sofre do mesmo mal de toda a espécie humana, e temendo que venha fazer suas reclamações neste espaço, já vou te redirecionar imediatamente ao Twitter para tal.

É de uma empresa que você quer reclamar? Cobre no Twitter. A dita cuja resolverá seu problema mais rapidamente do que em todos os anos de tentativa de contato pelo SAC. Tem monstros pessoais? Reclame deles no Twitter. Talvez os monstros não desapareçam, mas você sempre vai encontrar alguém sofrendo do mesmo vexame. A empatia será colocada em dia. Inimigos pessoais?  Esbraveje no Twitter. Se você tiver muita sorte – ou muitos seguidores –, todos comparecerão à timeline do nocivão do momento para cancelá-lo publicamente. Oposição política? Aí não vai ter jeito. Você vai ter mesmo que procurar o Twitter. É lá que a política anda acontecendo, amigo, não sabia, não? Mágoas? Twitter. Desabafos? Twitter. Desaforos? Twitter. Perseguições? Twitter. Frustrações? Descarregue tudo no Twitter.

Não posso prometer que você resolverá todos os seus problemas, nem que estará livre de julgamentos, nem que não será o cancelado da vez, nem que sua forma de se relacionar será tão construtiva assim, nem que terá o amor de volta em sete dias…

Mas reclamar, é batata, você pode. No Twitter.

Imagino que esteja ansioso para começar, mas antes de sair…

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Adna Maria é pernambucana, bibliófila e aspirante a escritora. Tem formação em Jornalismo e Geografia.

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